quinta-feira, 20 de julho de 2017

ISTO EXPLICA


ISTO EXPLICA
Adriane Garcia, p. 23 do livro O nome do mundo, 2014
Não fui a menina dos undergrounds
Das agitações noturnas...
Das leituras insólitas
Dos dionisíacos saraus
Meu campus era o campo
Onde eu cavoucava batatas
E ficava feliz, se raro, era doce
Vivi na terra vermelha
Sem xampu, mamãe tentava
Alisar-me os cabelos
Ver se ficava branca
Eu parecia
Mas havia um banzo

Negra acima de tudo
A alma
Por sorte aprendi a ler
E consegui decifrar as placas
No navio
Cheguei atrasada
Uns mil anos
Para a aula
Sobre Rimbaud.


(resolvi postar hoje esse poema, porque acho saudade um bicho roedor e vim protestar a ausência desta poeta no face book. Aquele espaço precisa de pessoas criativas, sensíveis e inteligentes, na medida do possível e às vezes do impossível.) Pronto. Recado dado.

sexta-feira, 14 de abril de 2017

Livro para ler na Páscoa



Giselle Ribeiro que livro indicar para ler na Semana Santa? 

- A semana não é santa se fazemos da nossa mesa um mar morto. O bom seria sair para nadar entre peixes e sereias. Em vez disso, amolamos o anzol, fiamos a rede e dos 365 dias tiramos apenas uma semana para nos tornarmos santos. Santos que mastigam pedaços do mar, um novo batismo, pensam todos. 

E o livro? 

- Eu ia chegar nele, mas você seguiu pelo atalho. É preciso nadar entre peixes e sereias, foi o que disse antes do atalho.  E se você me provocou eu digo que os bons livros não sobrevivem só uma semana... E seguindo a tradição é bom fazer um retiro e ficar Só com peixes. Uma publicação linda da Confraria do vento. O livro tem cheiro de peixe vivo e água de toda sorte. Adriane Garcia nos prende na sua rede até o último gole do mar, do rio conduzidos por um cardume de Aruanã, Curimatã e Matrinchã até avistarmos o farol.  

Giselle Ribeiro se fosse para estar em uma ilha deserta quem escolheria para estar com você na ilha? Algum nome especial ou preferiria estar só? 

- Só, com peixes. 

Mas o que comer nessa ilha? Alguma carne vermelha para acompanhar a salada? Você gosta de salada como? 

- Só com peixes. 

Pra você antes só do que mal acompanhada? É isso? Você prefere estar só? 

- Só, com peixes. 

Um poema para finalizar? 

- o poema não finaliza. Ele existe para pororocar em nós. Então eu proponho um leve empurrão para dentro do livro Só, com peixes da Adriane Garcia: 

AFÃ DE OUTROS ABSURDOS 

Dê-me estes peixes todos
Entrarão vivos em mim
Rápido os peixes os peixes!
Feito luzes me acenderão
Acenderei para o céu
Feito um cristo
Quero fugir alaranjada
Estou urgente ávida
De um sonho.

Adriane Garcia, Só, com peixes, p.77, 2015.

 

 

 


terça-feira, 28 de março de 2017

Página de Jornal Nenhum

    Entrevista do Jornal Nenhum com a poeta Giselle Ribeiro:
Você tem um livro publicado chamado “69” e vai lançar outro no mesmo gênero. Como é escrever para adultos?
- É com caneta. É com papel. Às vezes no computador; Às vezes com celular. Às vezes na areia. Não tem segredo maior que se despir de algumas amarras e mandar ver. Assim como se escreve os outros gêneros. É preciso compreender que o amor é natural, nos alertou Drummond, naquele livro em nada proibido.
Como você se tornou desbocada?
- Talvez eu não tenha chorado quando nasci e, quem sabe, me deram um tapa na boca e eu desboquei. Há quem diga que eu engoli o capeta. Que eu sou uma vergonha. Que eu não deveria ser convidada para palestrar. Que eu só falo disso. Mas eu falo. Não me calo. E falo de outras coisas também, da mesma grandeza. Falo de viagens em aspiral no “Isso não é um livro. Isso é um caracol” (2014). Neste livro vou me arrastando pelos nossos escombros e derrubando muros.
Ele também tem poemas eróticos?
- Eu já disse que não me calo. Então se no meio de outro gênero, esse aparecer, ele vai dar a sua cara para ser beijada e não mais para baterem. É preciso entender que o amor é natural e que ele aprece em algumas curvas da nossa história.  
Então você se considera uma pervertida?
- Naturalmente.
Fecham as cortinas. A poeta levanta, pega água para beber. Bebe e lava a alma.
Finda a entrevista sem revelar mais sobre o próximo livro de poemas eróticos. Mas sabemos que já está quase concluído.